“Tive o prazer de conhecer Beatriz Azevedo quando ela assistiu um curso que Alexandre Nodari e eu demos no Museu Nacional em 2012, “Do matriarcado primitivo à sociedade contra o Estado e além. Cartografia da hipótese antropofágica”. Oswald de Andrade era, obviamente, o personagem principal — o convidado de honra, digamos assim — do curso. Beatriz nos ajudou imensamente, com seu conhecimento tão extenso como profundo da obra e da biografia de Oswald.
Antropofagia – Palimpsesto Selvagem é talvez a primeira leitura realmente microscópica do Manifesto Antropófago, texto fundacional para a sensibilidade cultural contemporânea, tanto “aqui dentro” como, cada vez mais, “lá fora”. O livro de Beatriz Azevedo é um close reading de valor histórico, didático e analítico inestimável.
Em um verdadeiro trabalho arqueológico, a autora recobra muitas das fontes esquecidas ou ignoradas das abundantes alusões enigmáticas (sobretudo para o leitor de hoje) contidas no Manifesto; comenta e elucida linha a linha, aforismo a aforismo, esse texto extraordinariamente complexo, por baixo — palimpsesto — de sua concisão telegráfica e sua alegre ferocidade lapidar; destaca-lhe a arquitetura rítmica, verbal como visual, sua (a)gramaticalidade poética e sua radicalidade político-filosófica; persegue, na produção posterior de Oswald, os fundamentos, os desenvolvimentos, as explicações — no sentido literal de desdobramento do que estava implicado, implícito, compactado — e as retomadas em modo dissertativo ou conversacional das teses, revolucionárias então como revolucionárias hoje e amanhã, enunciadas, ou melhor, anunciadas no Manifesto.
O livro de Beatriz Azevedo, somando-se à já vasta “oswaldiana”, acrescenta-lhe uma camada de comentário destinada a se tornar referência obrigatória para todo estudante ou estudioso da obra deste que é, sem a menor sombra de dúvida, um dos maiores pensadores do século XX”.
EDUARDO VIVEIROS DE CASTRO Antropólogo
[prefácio a Antropofagia Palimpsesto Selvagem]
Coisa de artista
“Mas, como se isso não fosse pouco, é às antenas da artista, desses “sismógrafos sensibilíssimos dos desvios físicos da massa”, como definia Oswald, que devemos os maiores achados do livro. Como boa musicista, Beatriz Azevedo atende ao “mundo orecular” do Manifesto, lendo-lhe os “sinais”. Desse modo, ela descobre como o aforismo “Fizemos Cristo nascer na Bahia. Ou em Belém do Pará” é referência direta a um maxixe composto por Sebastião Cirino e Duque, num “procedimento de impregnação da cultura popular na literatura modernista”, que “agrega o importante elemento afro-brasileiro”, já presente em Pau Brasil. Ademais, a proposta de ouvir o Manifesto possibilita-lhe elucidar não só seu conteúdo, mas também a sua forma (no que talvez seja a sua grande contribuição, se formos destacar uma), atentando para os “refrões”, “mantras”, a “arquitetura de ecos” que serve para “fundir a dimensão espaço-temporal”, criando o contexto do texto, o “matriarcado de Pindorama” e evocando a “vivacidade rítmica do índio”, em suma, para a “partitura textual” que se mostra, pelas lentes — ou ouvidos — perspicazes da autora, inclusive nos sinais gráficos, portadores de uma “função rítmica”. Por essa via, Beatriz vai trazendo à tona a forma como o texto arma e rearma, arranja e rearranja, uma cena enunciativa, o modo como ele manifesta o antropófago, e como tal canibal se manifesta por meio dele”.
ALEXANDRE NODARI, crítico literário e professor da UFPR
[Revista Quatro Cinco Um]
“Beatriz Azevedo faz como Oswald, lê o “Manifesto” separando as partes. Ritualiza assim a leitura, oferecendo-nos os sabores mais incomuns do texto potencializados também para perturbar o paladar domesticado de nossa época.
Mais do que anatomia, Azevedo nos lega uma curadoria, ou melhor ainda, uma “curanderia” com o texto de Oswald. Os protocolos acadêmicos são purificados de sua pompa doentia.
Entendemos que a importância da antropofagia está no potencial “deseuropeizante” da criação cultural brasileira. No potencial devir indígena, um devir selvagem, aberto ao outro, descolonizante, entregue à floresta, encontramos o desafio brasileiro.
Podemos então começar por comemorar a reinauguração do Brasil em uma data mítica. Se há 462 anos se dava a devoração do bispo Sardinha, é a hora de passar ao banquete e servir-se das palavras apetitosas de Beatriz Azevedo. Assim como Morubichaba ao devorar o seu assado, posso garantir que é gostoso”.
MARCIA TIBURI, escritora e filósofa.
[ILUSTRÍSSIMA, Folha de S.Paulo]
“Foi nesse cenário que me pus a ler “Antropofagia – Palimpsesto Selvagem”, de Beatriz Azevedo. Fiquei pensando que o resto do mundo devia olhar um pouco para o Brasil.
Beatriz Azevedo lê o Manifesto como um palimpsesto, “pergaminho que, reescrito diversas vezes, acaba resultando em uma somatória de tempos diversos”.
Falta ao mundo de hoje ler Oswald de Andrade. Angela Merkel deveria ler Oswald. Marine le Pen deveria ler Oswald. Donald Trump deveria ler Oswald. Os britânicos que votaram pelo Brexit deveriam ler Oswald. E nós mesmos deveríamos ler Oswald e sua filosofia antropófoga. Aprender a devorar o outro não no sentido de massacrá-lo, destruí-lo, mas para nos tornarmos mais complexos, plurais. Para nos tornarmos Outros.
TATIANA SALEM LEVY doutora em letras e escritora.
[Jornal VALOR]
A cantora, compositora e ensaísta Beatriz Azevedo escreve com uma interpretação inovadora, polêmica e provocadora. Com a liberdade de artista e a voracidade de antropófaga, Beatriz Azevedo revisitou as ideias de Oswald de Andrade e escreveu um livro que já nasceu na condição de clássico sobre o tema: Antropofagia – palimpsesto selvagem (Cosac Naify). Ela retomou o Manifesto antropófago, de Oswald de Andrade, frase por frase, palavra por palavra, para oferecer um banquete de ideias, a um só tempo, saboroso, polêmico e provocador.
SEVERINO FRANCISCO
[Correio Braziliense]
“A poeta, compositora e pesquisadora Beatriz Azevedo tem sido voz ativa na divulgação das ideias e ideais de Oswald. Fascinada pela potência do manifesto, deglutiu páginas e páginas, por anos, até conceber um livro: Antropofagia palimpsesto selvagem. A obra – belíssimamente editada pela Cosac Naify, com capa desenhada por Tunga – destrincha o Manifesto antropófago.
‘Antropofagia palimpsesto selvagem’ é uma minuciosa análise do manifesto criado por Oswald de Andrade. A autora descreve o percurso trilhado por Oswald, contextualiza as referências históricas, dimensionando-as e distiguindo que os postulados carregam de circunstancial ou atemporal. Beatriz concebeu o livro em estrutura de refeição, um cardápio que começa com aperitivo, entrada, primeiro prato e chega até o prato principal. Nesta parte, a autora se dedica a comentar, um a um, os 51 aforismos que compõem o Manifesto antropófago. Em seguida, se concentra em apontar a polifonia e as múltiplas direções contidas no texto. Mais do que determinar uma ou outra interpretação, a obra lança luzes sobre o processo, sempre em mutação, da obra oswaldiana.
Certamente, o olhar renovado de Beatriz Azevedo sobre o Manifesto antropófago vem em boa hora. Inconformista, idealista e eterno provocador, Oswald de Andrade e sua antropofagia se faz mais urgente do que nunca. Afinal, “tupi or not tupi that is the question”.
PABLO PIRES
[O Estado de Minas]
A poeta Beatriz Azevedo é arrepiante. Isto é, ela vai fundo na essência do ser, mas sem nunca perder as perfeições da forma. Ao lado do seu grande espírito poeta, sentimos nela a leitora voraz, super-informada, super interessada em tudo, agitadora cultural contemporânea. Do seu disco de poemas bum bum do poeta até o happening sacro-profano peripatético poema-de-chão nota-se um denominador comum: diamantina e reluzente andando como se fosse bailarina da sabedoria. Beatriz Azevedo não só é eterna e moderna, como é a junção e a atomização nuclear do vigor, do talento e da beleza.
JORGE MAUTNER
[prefácio a Idade da Pedra]